domingo, 9 de setembro de 2007

ESPUMAS XXXIX



As calçadas, meu senhor, as calçadas, as lisboetas, já não são o que eram. Suspiram para serem encostadas umas às outras pelo peso do seus massagistas, alheios ao prazer e à dor do seu temporário sustento, essas pedras pobres em leveza e ricas em luz. Não há tempo, meu caro, há muito tempo, imagina os dias previsíveis?, as pessoas são inconstantes, ora se são, por vezes passam depressa, muito depressa, outras vezes param, os mais ousados, os espertalhões, encostam-se, à espera de um sinal urbano de cor negra e de fundo colorido, sem pingo de criatividade. E qual é o melhor caminho calceteiro, oh, meu caro sneho, pergunta divina e diabólica, pergunta o caminho a um português, aqui ninguém conhece a cidade, homem de deus, trabalhará o meu camarada no futebol ou na justiça e saberia-lo com certeza, agora nesta hora do Senhor e neste canto de jangada perdido, meu senhor, como quer que lhe responda, quer de dia ou de noite, mas que raio, faz alguma diferença, toda, pois claro, não havia de fazer nesta cidade morta e cinzenta, com tão pouca vida interessante e cedida ao trespasse. Não lhe pergunto mais, peço desculpa, na verdade até parece que pela Internet darei com o caminho, pois, bem me queria parecer, já nada se faz com o corpo e a alma, tudo agora é com a ponta dos dedos, adeus mundo a nossos pés, como outrora, belos tempos não caro descendente dos grandes descobrimentos, não, homem dos negócios estrangeiros, eu mal dou com o caminho, embora nesta cidade, de tudo se descobre, sobretudo enrolado em tapumes e poeiras, siga o caminho, então, que lhe aprovuver, é isso pois que tentarei, penso que até sei lá chegar, ah!, pergunta por perguntar, está a ficar português, caro negociante estrangeiro, pergunta para confirmar, sinal dos tempos desta era das TIC que no meu tempo eram transportes, pois claro, tudo é acessível por todos e paradoxalmente a insegurança brada os caminhos dessas redes sem fim e sem fios - que saudades da minha velhinha antena - na verdade... oh meu caro bife, desculpe a franqueza, não me venha com pantominices, todos perguntam para confirmar, a confirmação procura-se em todos os lados, nos quiosques, nos amigos, nos médicos, nos advogados, até na televisão, com um telefonema para o consultório, outro para a opinião pública, e tudo se confirma. Bom, tudo não é bem assim, quase tudo, desculpe-me meu caro esta tendência do meu povo, sempre fomos adeptos do absolutismo, portanto, digo quase tudo porque o resto é para se perguntar porque não fez melhor, isto é, para se criticar, de preferência de forma calceteira, pois claro, quem não gosta, ah, ah... Portugal é uma nação antiga, ei, ei, calma!, antiga sim, mas nação?, nação é Lisboa, aqui não há ponta... com calceteiros e aspirantes, e quem não embarca, leva com a calçada em cima, dos pés, porque o povo português, embora não pareça, parece andar com os pés enterrados quando caminha. Nunca se apercebeu? Eu percebo, tem que viver mais por cá e ver mais televisão portuguesa. Aqui fala-se mais com os pés do que com a boca, talvez seja o peso Hstória, ou do orgulho, mas para mim são plumas, meu senhor estrangeiro, como este povo amante da superficialidade, somos plumas da História, meu caro... Tenho que ir andando, peço-lhe desculpa, queria ver a calçada ainda hoje, senhor, senhor lisboeta? Desculpe! Primeiro sou português, depois vem esta terra que piso! Vá lá, encontre o seu caminho, que Santiago não se encontra nas esquinas lisboetas...talvez um Lizarran.

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