O discurso político não se esgota em propostas políticas, e estas nem sempre concernem a políticas públicas. Aquele também pode ser usado como instrumento de resposta, ou contra-resposta, à oposição ou a determinados "dizeres" da opinião pública, vulgarmente confundida com comentadores e líderes de opinião. Ou ser usado na definição de orientações internas de comportamento e reflexão dos respectivos militantes que o próprio orador protagoniza. Todavia, em tempos de campanha pré-eleitoral, e eleitoral, os líderes partidários têm o dever de fazer propostas políticas concretas de governação e de políticas públicas, e de as discutir publicamente, nomeadamente com os seus camaradas, alguns deles autores dessas mesmas propostas.
Neste fim-de-semana, e reportando-me apenas ao que vi noticiado em três canais de informação diferentes, confirmou-se a dificuldade de os políticos concretizarem as suas ideias e promessas, carecendo o discurso político de profundidade e de propriedades objectivas e corpóreas ao nível da argumentação e do impacto na área da governação em que se inserem. Não obstante, parece haver uma clara distinção entre o esforço de Sócrates e as "iniciativas" de Ferreira Leite. Pouco ou esforçado, Sócrates procura juntar dezenas de pessoas, nem todas militantes do partido socialista, unidas por um determinado grupo ou característica social, e, ainda que segundo determinadas regras pré-fixadas, submete-se ao escrutínio argumentativo, reactivo ou passivo, desse grupo, referindo-se mais ao que procura fazer e que já fez, do que ir a reboque das "afirmações" e "propstas" sociais-democratas. Ferreira Leite é a antítese: o aparelho junta um conjunto de camaradas seus e o discurso da líder esvazia-se nas raras propostas ou ideias que transmite, envolvidas numa imagem discursiva contra-governamental, em enquadramentos anti-socráticos e na promessa de que com ela vai ser diferente, sem expor, em rigor, qualquer argumentação clara, objectiva e densa (porque não?) sobre como será diferente ou, por outras palavras, como pretende governar o país.
Para quem é atento às minudências dos actos políticos dos candidatos políticos, esta diferença constitui um critério substantivo do avaliar sobre o estar na política: bem ou mal, seja-se contra ou a favor, é crucial saber-se que bandeiras os líderes pretendem hastear no exercício do poder político e de como pensam fazê-lo, a um nível de concretização retórica que deve ser muito mais rico do que o habitual. Quer-se queira ou não, o povo, apesar de massa incorpórea, não é o mesmo que há de 10, 15 ou 20 anos. os eleitores percebem que, sendo os políticos "gente normal", quem tem um discurso essencialmente inter-partidário e esvaziado de propostas palpáveis não tem capacidade, nem merece, ganhar eleições.
Os tempos políticos exigem características específicas de governação, nomeadamente visão, determinação e responsabilização no e pelo exercício do poder. E é através delas, por entre espumas comunicacionais sempre valorizáveis, que se vislumbra na campanha pré-eleitoral uma certa diferença entre os principais candidatos, para além do estilo, e que considero de todo relevante para se bem-escolher o próximo chefe de governo português, na esperança de se eleger o que pior representa este conjunto de características de governação, exceptuando todos os outros.
1 comentário:
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