segunda-feira, 28 de fevereiro de 2005

A coitada e os bons

Popper tinha razão e as últimas eleições portuguesas confirmam-no: a democracia evita a derrocada da liberdade e derruba quem contribui para a manter, sem necessidade de uma revolução ou golpe de estado!

Afinal de contas, a democracia funciona, pobre coitada! É o pior regime político garantístico, mas é o único com essa característica. O povo tem pouco poder, mas tem o poder dos poderes. Um voto não elege ninguém, mas faz toda a diferença no sufrágio. Votar é pôr políticos no ‘poleiro’ e contribui para arranjar ‘tachos’ aos outros, mas qualquer cidadão tem igualdade de oportunidades para chegar a ‘tachista’. A Política é uma seca, mas sem ela vivíamos sob a lei da força humana, a lei da selva.

Era bom que Rousseau tivesse razão, mas não passaríamos de uns selvagens mesmo na ‘sua’ sociedade. Era bom que o mundo fosse outro, que tivéssemos tempo para tudo aquilo que gostamos, mas o ser humano não é tudo, nem todo, e muito menos perfeito. Por isso, os nossos defeitos e virtudes são o reflexo da nossa humanidade.

Curiosamente, a democracia é o sistema onde mais nos confrontamos com os nossos defeitos e as nossas limitações. É o sistema onde temos que dar mais que a nossa liberdade, o que é uma chatice porque obriga-nos a ser responsáveis por nós próprios. Nos regimes autoritários quase que não temos problemas, dadas as escassas expectativas que nos são impostas. E os ‘outros’, os políticos, são pessoas de bem e de grande moralidade, sobretudo porque pouco se sabe deles e o que se sabe é manipulado. Mas na democracia, frágil coitada, tudo se se sabe. E todos têm defeitos e excessos! Ninguém é perfeito ou excelente?! Os políticos são humanos?! Que maçada, este estúpido regime político que nos consciencializa do nosso pequeno valor individual, nos limita à nossa humanidade e nos exige constante responsabilidade pelos nossos actos!

De facto, a democracia, a coitada, nunca será perfeita, pelo menos enquanto formos nós, os bons, a idealizá-la.

NCR

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