Eu, Pedro Soares Lourenço, me confesso. Saí dos bancos da escola onde me licenciei em Direito sentindo-me um positivista, legalista, estadualista, mas acima de tudo um normativista. Aqui as referencia são o enorme e incontornável jurista austríaco Hans Kelsen. Mas também o filosofo e cientista politico Italiano Norberto Bobbio de quem sinto ter de ler muito mais.
Posta esta formação, decidi oferecer-me ao sacrifício de um banho a-normativo. Ando a dar os primeiros passos nesse calvário chamado Mestrado. Numa escola que de Direito apenas tem uma secção autónoma. Numa escola para quem a Lei é uma coisa chata a que de vez em quando se tem de obedecer para formar uns alunos e receber o dizimo do OE.
Ando à procura das Novas Fronteiras do Direito!
"Porquê, conhecias as antigas fronteiras?" provocação perspicaz de um velho amigo.
Será o Direito um jogo sem fronteiras? Se não, onde se joga esse jogo. Na Ética, na Moral, na Sociologia, na Psicologia, na Filosofia, na Política, dentro da sua própria ciência? Na economia? Em todos estes tabuleiros?
Confesso que ando em pulgas para encontrar respostas a tantas perguntas. Ou vá lá, pelo menos a alguma delas.
Mas até agora, em vez de respostas, só tenho encontrado mais, e mais perguntas!
Confesso igualmente não usar palas nos olhos. Muito pelo contrário. Luto por manter os horizontes bem abertos e arejados; mas tenho as minhas ideias (mais ou menos fixas); admito sempre que as possa mudar, mas admito também que por elas vou lutar.
Tudo isto, vejam bem, para perguntar a mim mesmo como é possível procurar fronteiras, ou outra coisa qualquer, do Direito, num pensador que disse nos seus últimos dias, ter tido “pena de nunca ter falado com juristas”?
Falo-vos de Michel Foucault. A sua obra é enorme. Apesar do seu desaparecimento há mais de vinte anos, é um autor incontornável no estudo do pensamento contemporâneo. Os senhores do CEJ apreciam-no e gostam de saber se os seus futuros alunos leram, por exemplo, o magnifico Vigiar e Punir.
Como por certo reparará o leitor atento estou nitidamente confundido!
O que é que um jurista pode encontrar de útil (conceito vago e indeterminado, este), para alem do puro gozo intelectual, em alguém que sempre desprezou o Direito, nunca se dignou a estuda-lo, nunca o reconheceu como ciência, e perto do seu leito de morte ainda ironiza com o facto de nunca ter tido contacto com juristas?
PSL
1 comentário:
Não é necessário falar com juristas para sentir a lei no corpo. Foi isso que Foucault fez: ele estudou os corpos e usou o seu para sentir o poder da lei a trespassá-lo e a marcá-lo.
Não é necessário falar com músicos para sentir a música ou escrever sobre ela. Eu também ouvi professores meus a dizer que a música é uma ciência que pode ser estudada matematicamente. Mas eu não considero a música ciência, da mesma forma que o Direito também não é uma ciência.
Uma ciência, entre outras coisas, tem de conseguir prever fenómenos com grande exactidão. Mesmo a micro-realidade, com todo o seu indeterminismo, pode ser estudada pela ciência e prevista com essa mesma grande - mas não total - exactidão.
As leis são o resultado de um paradigma cultural e histórico. Foucault apenas quis, com o seu pensamento, estudar o poder e o conhecimento pela maneira como estes agem no policiamento dos corpos.
(Já agora: começar um post com uma confissão é MUITO Foucauldiano! :-D)
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