quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

Do Natal

Já não passava o Natal em Lisboa entre família há dois anos. Tinha saudades e está a ser muito bom recuperar alguma da tradição inerente à quadra. Alguma.
Entre Festas, sonos trocados e ondas geladas mas bonitas na eterna Caparica, lá fui cogitando estas linhas. Porque desde há cerca de meia dúzia de anos para cá, para mim, o Natal, significa também o momento mais alto de reflexão sobre o Sublime, o Uno, o Valor, o Sagrado.

Só existe uma única razão para festejar o Natal.
Na falta de melhor, como qualquer dicionário apontará, Natal reporta a natalício, nascimento; sendo, mais concretamente, o dia em que se comemora o nascimento de Jesus Cristo. Sublinho: o dia em que se comemora o nascimento de Jesus Cristo.
Jesus Cristo não foi uma qualquer abstracção. Jesus Cristo, para além de um homem que nasceu, viveu e morreu, como qualquer Homem, é antes de Tudo o Mais uma figura histórica.

Só existe portanto uma única razão para festejar o Natal. Tudo o mais, "os sinos que tocam", a "fé na aurora", o papel que se rasga, o presente que não presta, o bacalhau, a rabanada, o arroz-doce, o peru, o borrego, o leitão, o Pêra-manca e o Cartuxa são cantigas. Como são cantigas as linhas que falam no espirito de/do Natal.
Por exemplo, no blogue de uma amiga, leio que ela não fez a arvore de natal mas que carrega consigo o espirito de natal. A "fé na aurora" e o espirito de natal são dimensões diferentes mas idênticas dos natais dos hospitais e dos natais da tertúlia cor de rosa da Fatima Lopes.
Confesso, aliás, que sempre que oiço a expressão espirito de natal fico um pouco aterrorizado. Lembro-me sempre de um tal de Savigny e dos seus discípulos defensores da ideia (nos alvores do século XIX) do direito alemão dever ser encontrado no espirito do Povo (o volksgeist). Esse direito fundado (e legitimado) no volksgeist deu no que deu por volta de 1914, já lá vão quase cem anos.

De facto, "os sinos que tocam", a "fé na aurora" e outras subjectividades/vulgaridades/banalidades como o comum espirito de Natal (sinceramente perdoem-me os meus queridos amigos cujas palavras cito aqui, recordem: estou apenas a tentar discutir ideias que me atormentam, nada mais) não passam daquilo que são porque são o que cada um muito bem entender. Logo Valem (repito Valem) zero.

Por exemplo. Das paletes de sms que receberam neste Natal, falou-se concerteza de sapatinho, Pai Natal, prendas, chaminé, esperança, reflexão e até de "putas e vinho verde".
Do menino-Deus, filho do Pai, o Salvador, nada, bola, zero.
De Jesus Cristo, nem sequer falo do profeta, apenas e só do Homem que nasceu, viveu e morreu como qualquer um de nós, que ensinou a quem quis aprender o que sabia (actividade essa tão nobre); de Jesus Cristo essa figura histórica impar, para muitos o verdadeiro fundador dos Direitos Humanos, pura e simplesmente ninguém fala. Abrenuncio, nem sequer uma pequena nota de rodapé o homem merece.

Não se trata sequer de uma questão de religiosidade, de Fé. Trata-se sim de uma simples questão de respeito. De educação.
A fé pode estar abalada, o Divino pode ter-se apagado completamente do nosso espirito, mas nunca, nunca poderemos olvidar a verdadeira (e única) razão que nos leva a cobrirmo-nos de abundância por estas horas que passam. Essa razão, a única razão, é simples e claramente objectiva: aleluia, Cristo, o Homem, nasceu, há qualquer coisa como dois mil e oito anos.

[...na imagem deste post exageradeamente grande que peço que leiam com paciência de chinês, surge a fantástica Natividade do grande Mestre Giotto]

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