quinta-feira, 7 de dezembro de 2006

ESPUMAS XXXIII

Talvez aquele homem não conheça a fundo tudo o que diz, mas a regra nunca confirma a excepção. Tinha uma forma muito própria de comunicar o sentido das suas palavras, raramente atingindo a sabedoria do que ficava por dizer. O silêncio tinha uma voz própria no contexto dos seus discursos. Ouvia-se o que estava para além do modo assertivo como combinava a palavra e a respectiva postura coloquial de cada uma. Desafiava a plateia como ninguém e era tão fácil entendê-lo. Fluíam as ideias no espaço por onde deambulavam os tiros de raciocínio das pessoas que assistiam à sua prelecção. O seu lema catalogava-se na arte de fundamentar um pensamento de cada vez. Rubrica difícil de entender, apesar de não ser surpresa nele. Não era uma oferta, mas um brinde para quem se esforçava por estar presente. Já não há pessoas assim, sem pressa de estar e de falar, e muito menos espectadores do fim e do significado da mensagem. O tempo não corre a favor destes, bem pelo contrário. O tempo não pára, antes é devorado pelos seus utilizadores contra a corrente dos dias. Quando vejo e ouço o discurso deslegitimado daquele homem, criatura que nunca conheci pessoalmente – e desconfio que exista verdadeiramente -, tento sublinhar em mim, sempre que possível, que o argumento é a construção humana mais apurada de que a razão se pode servir para combater o tijolo das opiniões desguarnecidas e preconceituosas, alimentando o mundo em que estamos mergulhados. Instrução deficiente, educação frágil, crescentemente. E os tempos mudam, paradoxalmente sobre as estacas da denegação de outrora. O tijolo avança e avança, quase freneticamente. Até ao ponto em que mais difícil e caro de educar, é, cada vez mais, ensinar. Ou, no melhor sentido de vida daquele homem, comunicar em deliberação.

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