quarta-feira, 10 de junho de 2009

Partidos privados, perdões públicos

O veto presidencial sobre a alteração à lei do financiamento dos partidos políticos não teve cor política, ou melhor, tinha todas as cores e simpatias políticas. Mais do que as apelidadas «vergonha», «conspiração», «inadmissível», entre outras, concernentes à revisão da lei, é sobretudo um sinal de como a natureza humana é dominada pelos interesses corporativos e pela ganância colectiva, através de cada ser individual e uno. Todos e tudo carecem de vigilância, admitamos isso frontalmente, porque as evidências assim o demonstram, desde que o homem supostamente inteligente e completo, bem como a sua política, existe em sociedade.

O objectivo das elites é a autopromoção do seu estatuto, já dizia um politólogo famoso russo, referindo-se às elites partidárias, por sinal. Assim, o denominado bem comum, a favor do "povo", é uma condição vital para a sustentação do regime de governação. E ainda bem que é assim, como ainda bem que existem elites, pois, na generalidade, foram elas que deram os maiores feitos, inventos, progressos e descobertas da história da humanidade. O problema está quando essas elites são medíocres, não renovadas e/ou desinteressadas do bem comum; o grave, no que respeita aos partidos políticos, constitui a indignidade das mesmas quando se impede a sua renovação pela qualidade, quando os mais aptos para trabalharem pelo bem comum, que nunca são os mais inteligentes ou os mais qualificados (academicamente) - a História ensina-nos isso - mas sim aqueles que, com inteligência e qualificação, possuem a capacidade de ler o ambiente que o rodeia e o mundo de forma holística e colectiva (a que alguns designam pela inteligência comunitária) e de actuação coerente segundo essa leitura e interpretação.

Esta nova alteração recém-vetada só serve os medíocres, os conformados, os instalados, a cultura da predominância do capital corporativo em vez do humano responsável. Decidirem aumentar o seu financiamento, por razões de adequação da lei às (más) práticas partidárias e para garantir a solvabilidade do marketing partidário, por muito que não haja democracia sem partidos, é facto suficiente para que não sejam perdoados pelo 'público', como pode ter sido a maior razão para o nível de abstenção das eleições europeias. Mas o povo não tem sido senão perdulário para com este tipo de política e de (elitistas) políticos, tapando e abrigando a boa política e os bons políticos (e afastando ambas de crescerem). O povo tem perdoado esta Política ao não entrar em revoluções ou revoltas. É certo que há nichos de insatisfação e actos avulsos de violência material e física, mas nada mais. O povo tem perdoado o "tempo" da justiça sem argumentos para justificar o atraso para além do devido; o povo tem perdoado e dado o benefício da dúvida a todas as outras áreas da governação. O povo perdoa muito, porque, na verdade, e na generalidade, faz pouco pela democracia, faz pouco pela sociedade civil actuante. Como tudo, tem excepções, mas, dentre estas, se excluirmos os prazeres de participarem em clubes de futebol e automobilísticos, das associações lúdicas e profissionais, muito pouco povo resta nesta arte da acção do bom senso e do senso comum. É histórica e duradoura a falta de cultura da performance. A assunção, a actuação, o pisar o terreno, o calar heróico e individual, o sacrifício da “imagem ou status social” no povo português é como encontrar gaivotas no mar em dias de mau tempo; a maioria prefere abrigar-se em terra, fazer aos seus o discurso habitual da incapaz pátria, e da má sorte do mau tempo que foi logo abater-se sobre a generalidade da lusitãnia.

Como dizia hoje o Presidente da República, falta transparência (abertura+comunicação+responsabilização) às condutas humanas lusas, até porque elas, as condutas, são parcas, passivas, escondidas, comodistas, de pouco labor, de frugal esforço como escrever este post. Coisas que custam pouco, independentemente do seu valor. Não obstante, a bem-dizer, é já alguma coisa, por si já merecedor de um perdão, mas é insuficiente, na política escrever é sempre insuficiente. Pode ser uma arte maior e das mais belas do mundo humano, mas, na política, não chega. É preciso possuir o dom de mensageiro, aquele que, tal como Hermes, sabe bem guardar o valor da mensagem e entregá-la, a quem de direito. O povo actua pouco, abstém-se, tal sustenta a elite que aquela alimenta com remédios mascarados de panaceia, de acordo com os novos factos e os velhos hábitos. Entretanto, há uma imensa minoria, autêntica e activa em nome de um interesse público ou cívico, que tenta fazer algo para contribuir para que os partidos sejam mais políticos e os perdões mais privados.

(como sempre, a dispersão toma conta de mim: comecei por um tema e acabei noutro...ou não tanto assim; valha-nos a ciência social onde é sempre possível haver alguém que pense o mesmo e o contrário da mesma realidade existente. Bem-haja à possibilidade de revisão dos títulos e aos blogues, é esta a sua verdadeira natureza, certo? De escrita rápida, divagada, instantânea, espumosa, tipo ‘digestivo’, não?)

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